Senhor Presidente
Senhoras e Senhores Deputados
Ao contrário de outros Quadros Comunitários de Apoio, o Quadro de Referência Estratégica Nacional, vai decorrer num contexto macro-económico bastante mais desfavorável para Portugal, com a economia portuguesa a crescer de forma divergente relativamente à União Europeia, e sujeita à pressão da globalização e do alargamento.
Em 2000, tínhamos um PIB per capita de 81% da média comunitária a 25 países. Hoje, estamos na casa dos 71%. Afastámo-nos da Europa no crescimento económico, nos salários reais, na balança comercial, na dívida pública, no investimento e na competitividade.
Portugal só convergiu com a Europa na taxa de desemprego e na carestia de vida.
O país precisa de um choque de audácia e de novas fórmulas. Mas o QREN não apresenta novidades nem nas palavras, nem nos ingredientes. Inovação, tecnologia, recursos humanos, formação, requalificação, apostas, prioridades, coesão, desafios, competitividade, já lá estava tudo vertido no texto de 2000.
Só que estão metidos numa nova roupagem. O governo apresenta-se como inovador, mas basta abrir o embrulho do QCA III, ainda em armazém, para constatar que se trata do mesmo produto, agora nas mãos de um verdadeiro especialista da embalagem e do telemarketing.
E, naquilo em que é diferente, o QREN representa um retrocesso para a economia e o desenvolvimento equilibrado do país, e um passo atrás na gestão democrática dos fundos.
O Fundo de Coesão é um instrumento muito importante no combate às assimetrias regionais. É um elemento essencial entre a coesão e a competitividade. Pode o país evoluir na competitividade, mas estar a retroceder na coesão, na desertificação do interior e na pobreza.
Ao contrário das promessas governamentais de que todo o financiamento seria privado, os eucaliptos orçamentais da Ota e do TGV absorvem a quase totalidade dos 1.300 milhões de Euros previstos no Fundo de Coesão para as acessibilidades.
O aeroporto da Ota representa um gigantesco atentado ambiental. Ali será construído o maior aeroporto do mundo sobre leito de cheia. Numa zona de aluvião com 2 a 3 metros de altitude, onde confluem o rio de Alenquer, a ribeira e o Paul do Alvarinho, o rio e o Paul da Ota.
Para aterrar e nivelar tudo aquilo, será necessário movimentar 80 milhões de m3 de terra e pedras.
Falar do “Novo Aeroporto de Lisboa”, de facto, é falar de roubar a Lisboa o aeroporto que hoje tem e que lhe dá vantagens competitivas de proximidade.
O aeroporto da Ota é inútil, é desnecessário e é prejudicial para os utentes. É falso que o Aeroporto da Portela esteja esgotado, porque o futuro da aviação civil e comercial, não passa por mais aviões no ar, mas por maiores aviões. Porque se podem aproveitar os aeroportos militares do Montijo e de Alverca para fazer aterrar lá as companhias de “low cost”, que querem taxas aeroportuárias mais baratas, e já representam hoje muito mais de 50% do tráfego aéreo.
E para que se vão gastar agora mais 500 milhões de Euros a remodelar o Aeroporto da Portela?
Lisboa tem tudo a perder. O Turismo de “short breaks” tem tudo a perder, e com ele todo o comércio, a restauração, a animação e negócios complementares. 95% do tráfego de passageiros, tem a ver com o Turismo.
O Porto e o Norte têm tudo a perder, pois a Ota vai desviar tráfego, passageiros, clientes visitantes, e vai afectar dramaticamente o Aeroporto Francisco Sá Carneiro.
Esta é uma questão crucial, cujas repercussões negativas se farão sentir em muitas das próximas gerações.
Não é nossa intenção regionalizar este debate. Mas existe uma situação, que pela sua gravidade e consequências, não pode deixar de ser aqui denunciada. E estamos a falar do caso do Algarve. A única região do país que entrou em situação de “phasing out”, logo, deixou de poder aceder aos fundos do chamado Objectivo 1.
A entrada no “phasing out” representa um enriquecimento estatístico. Não representa um enriquecimento real. A quebra do FEDER e do FSE poderia ser contrabalançada por um reforço dos insuficientes 100 milhões de Euros do Fundo de Coesão previstos para aquela Região.
Refira-se que existem 13 regiões na Europa em situação de “phasing out”. Mas, em todas elas, os respectivos governos preparam-se para compensar as quebras dos fluxos financeiros com verbas nacionais, e com outros fundos europeus que não o FEDER e o FSE. Em Portugal, não!
A forma como o governo se propõe aplicar o Fundo de Coesão, agrava ainda mais o desastre financeiro em curso para a Região do Algarve, nos próximos sete anos. Nenhuma outra região do país leva tamanha pancada às três tabelas. Pela aplicação da nova Lei das Finanças Locais, são os municípios algarvios quem mais vai perder.
O PIDACC 2007 para o Algarve, é o expoente máximo da miserabilidade. 105 milhões de Euros previstos, três vezes menos que o PIDACC de há seis anos atrás.
Não há, neste momento, tirando um curto troço de estrada para uma passagem desnivelada sobre a EN 125, e que se arrasta penosamente, uma única obra de vulto em curso no Algarve. Não há um único estaleiro, de uma obra do Estado digna desse nome.
Até a Barragem de Odelouca, será construída com recurso ao crédito, ou seja, o serviço da dívida reflectir-se-á no preço da água consumida, ou seja, sairá do bolso dos algarvios. Chama-se a isto, na minha aldeia, “fazer a manta com o pelo do cão!”
E, com este QREN, o Algarve vai passar dos 1.406 milhões de Euros do QCA III, para uns ainda incertos 634 milhões do QREN. Ou seja, vai perder 772 milhões de Euros, o que representa uma quebra de 55%.
Se falarmos em termos de investimento global, o Algarve passa de 2.200 milhões de Euros nos últimos sete anos, para 1.000 milhões de Euros, nos próximos sete anos. Ou seja, um tombo de 1.200 milhões de Euros de investimento a menos!
Praticamente meio milhão de Euros a menos por dia, durante sete anos, incluindo sábados, domingos e feriados. Esta sangria financeira monumental do Algarve é um verdadeiro escândalo.
Uma região cujo sector turístico contribui economicamente, de forma directa e indirecta, com um produto que se estima entre 4 a 5 mil milhões de Euros por ano, dos quais seguramente, entre tributação directa e indirecta, de consumo ou de rendimento, pelo menos metade vai para os cofres do Estado, está a ter, por parte deste governo, um verdadeiro tratamento colonial. Suga o povo e as empresas do Algarve, e o que dá em troca, não passa de uma gorjeta.
Sr. Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados
Os 21.500 milhões de Euros em fundos europeus, têm que ser criteriosamente aplicados para inverter o rumo da economia, combater a desertificação e os desequilíbrios regionais, e melhorar o nível de vida dos portugueses.
O QREN parte atrasado, carece de metas e de calendário, reduz o esforço do Estado sem alternativas consistentes, e assenta na ausência de uma análise crítica e séria dos antecedentes, e no secretismo das razões das opções políticas que tomou.
Por tudo isto, a nossa apreciação sobre o QREN não pode deixar de ser muito, mas mesmo muito negativa.
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